Apesar de ser praticamente a minha primeira viagem internacional, eu estava tranquilo, sem ansiedade, curtindo o que tinha sido planejado e o que surgia na hora. Focado em aproveitar o presente. Mas nesse dia a ansiedade veio. Na hora, eu não sabia bem o motivo. Era ter que pegar aquele vendaval na rodovia novamente? Era porque o trecho de rodagem é mais longo? Ou seria a próxima hospedagem que ainda estava com valor duvidoso?

Opa, as motos ainda estão lá.


Não era nada disso. Era o destino da primeira trapista: Achel. As trapistas foram o motivo de traçar esse roteiro e estávamos indo não só conhecer o primeiro mosteiro trapista, mas também experimentar uma trapista que eu nunca havia provado. A Achel era o óbvio primeiro destino neste roteiro por causa da sua localização. Então minha pesquisa passou por ela várias vezes. Foi a que eu pesquisei mais detalhadamente: quais rótulos na torneira, quais estradas pegar, qual a hospedagem mais perto, etc. 

Achel, a primeira trapista do roteiro


A moça da locadora botou tanto terror com aquelas correntes gigantes que deu até alívio de ver as motos intactas quando acordamos. hahahaha, fala sério. Que nóia. Apesar da "grandiosidade emocional" que estava por vir naquele dia, a despedida do Gerben foi tão contrastante que chegou a ser engraçada:

- e agora vocês vão pra onde?

- para Valkenswaard

- ?

- ao sul de Eindhoven...

- não, eu sei onde fica, mas.... POR QUE VALKENSWAARD?? 

😂😂😂😂

Ele compreendeu perfeitamente quando expliquei o motivo...🍺🍻😏

O dobro da distância do trecho anterior, porém uma grande queda no tamanho: de 330 mil habitantes para pouco mais de 30 mil. 


De volta à A2 e seus ventos.


Para chegar a Valkenswaard, passaríamos antes por Eindhoven. Porém sem o risco de atravessar área urbana, já que todas as cidades têm anel rodoviário. Apesar do Google Maps falando no meu ouvido (fone), perdi o acesso do anel rodoviário sentido oeste e fui para o leste. Aproveitei um acesso a uma região urbana e indiquei pra Micheli que havia errado o caminho. Após uma mijada (ainda estávamos sob a frente fria), retomamos o caminho certo e logo chegamos no destino. 


Fomos diretamente para a estadia. Havíamos reservado uma habitação similar a um trailer, num parque de férias. Na verdade, mais parecia um container, mas não do mesmo material metálico (fibra?). Essas unidades padronizadas tem cerca de 3 x 9 metros. Numa ponta, quarto de casal de um lado e banheiro do outro; na outra ponta, quarto duplo de um lado e cozinha do outro. No meio, uma sala com mesa e bancada. Local perfeito para famílias ou pequenos grupos em viagem. O fato de ser uma hospedagem que combinava tantas características me fez começar lá o questionamento sobre as estadias de pernoite único. Falarei mais sobre isso em postagens futuras, mas para adiantar, percebemos que viagem de moto internacional não vale a pena ficar tão pouco tempo num local. Veremos isso mais pra frente e na postagem final dessa série, quando apresentaremos o desenho da próxima viagem.

Nosso trailer



Brugsheide Vakantiepark é um parque de férias, muito procurado por famílias durantes os meses quentes. Aliás, a grande atração da região é um grande parque aquático, a alguns quilômetros de distância. 


Essa hospedagem foi fora da zona urbana da cidade e na direção da Achel. Além disso, o valor era muito convidativo (€45 o trailer). Entretanto, na reserva (a ser paga no check in) eu tinha sido informado que ainda teria uma taxa de €10/pessoa, que conta como taxa de uso das instalações de lazer. Boa surpresa número 1 (BS1 - não confundir com bulshit): não cobraram essa taxa. Hospedagem excelente e barata.


Chegamos antes do horário de check in, mas deram a chave para que pudéssemos guardar a bagagem. Recomendaram a praça da cidade para almoçarmos. Alguns acessos à praça fechados, pois estava rolando uma feira no local. Melhor ainda!! Barracas de comida, queijos, doces, roupas, etc. Caminhamos um pouco e escolhemos comer numa barraca de kibbeling, que são iscas de peixe fresco frito com batata frita e molho. O peixe não leva tempero, mas acho que peixe bem fresco nem precisa. Eu e Micheli nos esbaldamos! 500g de kibbeling. 

Kibbeling! 😋


Caraca, era muito peixe! Mariana acabou indo de croquete ou sei lá o que. Vacilona. 


Acabou sendo um ótimo almoço, muita gente na rua passeando e visitando a feira. Em contraste com essa BS2, as tendas das barracas impediam uma boa vista da igreja da praça... 2x1.

E a igreja até era bem bonitinha.


Depois de retirar as motos enquanto os transeuntes riam de nossas correntes e cadeados, seguimos Bélgica adentro até o município de Achel. A queijaria que havia encontrado no Google, Catharinadal, fica num bairro residencial bonito e tranquilo. As opções de queijo....aaaaahhhhhh! Além de um blue cheese premiado, muitas outras opções. Eles também produzem manteiga, iogurte e mousse (BS3). Meu deus, alguém me tira daqui! Compramos queijos e mousses e batemos muito papo com a menina que nos atendeu, filha dos donos. É uma empresa de família.

Essa é a Catharinadal


E esse é o sorriso da Mariana na frente da queijaria... hehehe


Obs: nesses trechos a intruder deixa claro que não foi feita pra isso. Pesada demais e um guidão que não favorece as manobras. Mas o típico motor custom faz o deslizar em baixas velocidades muito agradável. E a posição de pilotagem favorece o admirar da paisagem. E eu sigo por aqui substantivando verbos aleatórios...

"Planar" com a Intruder por essas estradinhas no meio de florestas foi muito bom. Relaxante. 


Agora ao que interessa.


Voltamos o caminho até o desvio para o mosteiro da Achel. Estacionamento praticamente vazio. Em julho fica lotado, particularmente de bicicletas, pois trata-se de uma região muito procurada pela galera do ciclismo. Aliás, ali começa a Rota Trapista, um caminho de pequenas estradas e trilhas que conecta quase uma dezena de mosteiros trapistas, dentre eles os também produtores de cerveja La Trappe e Zundert.

Só o início da rota já dá água na boca.


Começou a chuviscar assim que chegamos, mas quem se incomodou? O pátio interno é longo e no final tem a loja do lado esquerdo e o bar do lado direito. Passamos na lojinha primeiro, pois ainda estava cedo. É, na verdade, um lojão! Presumo mais de 100 rótulos. Mas quem estava preocupado em contar? De passar o olho, acho que eu já conhecia (apenas de nome) uns 5%. Surreal. Também vendem geleias, pães e biscoitos. Na saída passamos lá novamente e compramos Zundert (duas 8 e duas 10) para acompanhar os queijos da Catharinadal. Essa trapista não estava no roteiro, pois o horário de funcionamento de sua loja é extremamente restrito. Como eu já sabia que os mosteiros trapistas vendem os rótulos de seus colegas, bebê-las não seria problema. 

Se liga no tamanho da loja...


Olha aí a Zundert, a trapista que não seria visitada nesta viagem .


No bar, bebemos todas as opções on tap: Blond 8 e Bruin 8. As demais opções, extra blond e extra bruin 9,5 são vendidas somente em garrafas de 750ml com rolha. As duas on tap são leves, doces e refrescantes, mas já marcante a complexidade das cervejas trapistas. Baixa carbonatação, encorpadas. A bruin é uma dubbel e, como toda dubbel, tem uma espuma branca e bem cremosa e duradoura. Doce e caramelada, o amargo do álcool vem no final bem marcante. A blond é bem refrescante e tem notas herbais. Deixa um sabor duradouro na boca. 

Tripel


Dubbel


A Achel, como eu já sabia, é uma das mais simples, mas a visita foi muito emocionante para mim. Era a primeira trapista. E ela é linda, suas cervejas são deliciosas e frescas, seus arredores trazem tranquilidade e inspiração. A viagem havia começado...


Na saída, aproveitamos para explorar as ruas de acesso aos muros do mosteiro. Uma delas tem alguns painéis com informações sobre as grandes guerras e o papel da região. O mosteiro, obviamente, abrigou fugitivos da guerra. Alguns arames farpados foram restaurados da época, mas infelizmente não consegui entender o que eram, pois os painéis estavam apenas em holandês/flamengo. E quem diabos consegue ler aquilo?  

Acesso ao mosteiro


Não entendi, mas não parece ser coisa boa.


Atenção - Alta tensão - Risco de vida


A BS4 foi a linha desenhada no asfalto dessa estradinha marcando a fronteira entre Holanda e Bélgica. Enquanto fazíamos as vexaminosas (porém obrigatórias) fotos em ambos os países (um pé em cada lado da linha), chegou uma família de... brasileiros! Rá. Pais visitando o filho que mora com a família em Eindhoven. Batemos um papo. A galera pira em saber que estamos fazendo a viagem de moto, principalmente quando a gente mostra todo o roteiro.

Legal, né?


E esse aí tá feliz demais


Na volta para o Brugsheide, parada no posto de gasolina para o primeiro abastecimento. Putz, não tem frentista, como fomos informados na locadora. Por sorte, um motoqueiro parou também e eu pedi para assisti-lo abastecendo para aprender. Ele imediatamente se prontificou a me ensinar assim que terminasse com a moto dele. Muito bacana, o cara ensinou tudo e dali pra frente tiramos de letra os abastecimentos. Os postos tem um ou mais totens para pagamento. Você insere o cartão, informa o número da bomba, digita a senha e retira seu cartão. Achei impressionante que o menu já passa para português depois que você insere o cartão. Depois desse procedimento, a bomba está liberada para uso. Você abastece e, quando coloca a mangueira de volta na bomba, ela desativa e o valor final é cobrado no cartão de crédito. Aí você pode voltar no totem e imprimir seu comprovante, se quiser, bastando apenas informar a bomba. Simples e prático.


De volta ao trailer, caímos nos queijos e Zunderts após o banho. Tontos e abarrotados, fomos pra cama. As camas são confortáveis e dormimos muito bem. 

Queijo maturado jovem


Queijo fresco com capa de mostarda


Zundert para acompanhar.


Que dia... Que viagem FODA!

Quem perdeu essa, ainda tem a desculpa de que não queria investir sem ter certeza de que um roteiro desses daria mesmo certo. Trouxa, mas compreensível.


Mas quem perder a próxima é definitivamente muito trouxa... hahahaha😎